Abin paralela: PF aponta conhecimento da minuta do golpe e favorecimento de familiares
As investigações da Polícia Federal (PF) no âmbito da Operação Última Milha mostram uma série de irregularidades no uso de sistemas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para espionar autoridades e desafetos políticos no governo Jair Bolsonaro.
Segundo investigações, policiais, servidores e funcionários da Abin formaram uma organização criminosa para monitorar autoridades do Judiciário, do Legislativo e da Receita Federal, além de personalidades públicas, como jornalistas, invadindo celulares e computadores. O esquema, que teria funcionado na gestão Bolsonaro, é investigado desde 2023.
Nesta quinta, os policiais cumpriram cinco mandados de prisão preventiva e sete de busca e apreensão em Brasília (DF), Curitiba (PR), Juiz de Fora (MG), Salvador (BA) e São Paulo (SP). Foram presos e foram alvos de busca e apreensão: Mateus de Carvalho Sposito, Richards Dyer Pozzer, Rogério Beraldo de Almeida, Marcelo Araújo Bormevet e Giancarlo Gomes Rodrigues.
De forma prelimitar, a PF vê os possíveis crimes de organização criminosa, tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, interceptação clandestina de comunicações e invasão de dispositivo informático alheio.
Confira abaixo alguns apontamentos da PF a Abin paralela.
- Favorecimento de familiares de Bolsonaro
A Polícia Federal (PF) aponta que a estrutura da Abin foi utilizada durante o governo de Jair Bolsonaro para favorecer dois filhos do ex-presidente, Jair Renan e Flávio Bolsonaro.
O relatório da investigação chamada de Abin Paralela, divulgada nesta quinta-feira (11) pelo Supremo Tribunal Federal (STF), indica que um policial federal que atuava na agência foi designado para espionar Allan Lucena, ex-sócio de Jair Renan em uma empresa de eventos. O filho do ex-presidente é acusado de tráfico de influência e lavagem de dinheiro pelo Ministério Público.
Já no caso de Flávio Bolsonaro, as ações clandestinas de monitoramento ocorreram contra três auditores da Receita Federal responsáveis pela investigação sobre “rachadinha” no gabinete de Flávio quando ele ocupava do cargo de deputado estadual. Segundo os investigadores, as buscas por informações sobre os auditores foi determinada pelo deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), então diretor da Abin.
- Conhecimento da minuta do golpe
Segundo a PF, alguns dos supostos envolvidos no esquema da Abin tinham conhecimento sobre a existência de uma minuta de decreto para promover um golpe de Estado, que poderia ser assinada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.
Uma das bases da investigação são os diálogos mantidos entre o militar Giancarlo Gomes Rodrigues e seu superior, o policial federal Marcelo Araújo Bormevet. Em dado momento, destaca a PF, Bormevet pergunta a Giancarlo: “O Nosso PR imbrochável já assinou a porra do decreto?”. O militar responde: “Assinou nada. Tá foda essa espera, se é que vai ter alguma coisa”.
Para os investigadores, “as referências relacionadas ao rompimento democrático declaradas pelos policiais é circunstância relevante que indica no mínimo potencial conhecimento do planejamento das ações que culminaram na construção da minuta do decreto de intervenção”. A observação foi feita no requerimento no qual a PF pediu a prisão preventiva dos dois investigados, bem como o compartilhamento de informações entre o inquérito da Abin paralela e o da minuta do golpe. Ambos os pedidos foram deferidos por Moraes.
- Monitoramento das investigações sobre a morte de Marielle
O relatório de investigação concluiu ainda que a estrutura da Abin foi usada durante o governo Bolsonaro para monitorar ilegalmente o andamento da investigação sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, em 2018.
De acordo com relatório de investigação do caso, agentes foram designados para buscar informações sobre a promotora do Ministério Público do Rio de Janeiro Simone Sibilio e o delegado da Polícia Civil do Rio Daniel Freitas da Rosa, que atuaram na investigação do homicídio. As buscas foram feitas por dois policiais designados para a tarefa e a PF descobriu que, em 2019, um dos policiais imprimiu o currículo da promotora.
Os investigadores também encontraram um arquivo eletrônico de texto com um “controle de denúncias” sobre o caso Marielle, onde estava escrito “Caso Marielle, total de 292 denúncias. No ano de 2019, foram 72. Nenhuma informação da família Bolsonaro. Denúncia dos Brazão, 9. São 192 denúncias mencionando milicianos como autores. Na semana do homicídio, receberam 52 denúncias do caso”.
Para a PF, o monitoramento das investigações sobre o assassinato ocorreu para “antecipar eventuais referências que vinculassem o núcleo político” do esquema ilegal do monitoramento na Abin, ou seja, saber se a família Bolsonaro teria sido citada na investigação. O relatório das diligências ilegais foi impresso por Alexandre Ramagem, então diretor da Abin, e atual deputado federal pelo PL do Rio de Janeiro.
- Áudio prova atuação da Abin paralela
O áudio de uma conversa entre o ex-presidente Jair Bolsonaro, o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno e o ex-diretor da Abin, Alexandre Ramagem, prova a atuação da Abin paralela durante o governo do ex-presidente, conclui investigação da Polícia Federal.
Segundo a PF, a gravação de 1 hora e 8 minutos, que está em segredo de Justiça, foi “possivelmente” gravada por Ramagem e ocorreu em agosto de 2020. A corporação indica que conversa está relacionada ao uso ilegal da Abin para obter informações sobre a investigação na qual o senador Flávio Bolsonaro foi investigado por “rachadinha”. A advogada de Flávio, que não teve o nome citado, também teria participado da conversa. Em 2021, a apuração foi anulada pela Justiça.
“Neste áudio, é possível identificar a atuação de Alexandre Ramagem indicando, em suma, que seria necessário a instauração de procedimento administrativo contra os auditores da Receita com o objetivo de anular a investigação, bem como retirar os auditores de seus respectivos cargos”, aponta o relatório.
- CPI da Covid
A Abin também teria sido utilizada, de forma clandestina, contra o senador Alessandro Vieira, que participava da Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid do Senado, mostram investigações da PF.
Alessandro Vieira apresentou um requerimento para que Carlos Bolsonaro, prestasse esclarecimentos à CPI e também para que fossem quebrados os sigilos bancário, fiscal, telefônico e de mensagens do vereador do Rio de Janeiro. Nesse contexto, os investigados Marcelo Bormevet e Giancarlo Rodrigues teriam atuado para produzir “desinformação” sobre Alessandro Vieira.
Os policiais destacam um diálogo no qual Giancarlo diz “Senador Alessandro Vieira que está na CPI”, e Bormevet responde “Somente lixos”. “Vamos difundir isto. Pede pra marcar o CB (Carlos Bolsonaro)”. Giancarlo responde com “Já estou municiando o pessoal”. Os policiais destacam que a difusão de desinformação ocorria com “marcação” de integrante do núcleo político do esquema ilegal, no caso, Carlos Bolsonaro.
Por Redação, com informações de Agência Brasil e G1